sexta-feira, 7 de julho de 2017

brinca comigo









ele brinca comigo. 
ele chega sem avisar, e, matreiro, joga aos berlindes com as minhas sensações e desperta os meus arrepios, faz vertigens dentro de mim. 
ele esconde palavras nos recantos do meu corpo - suavidade, intensidade, calor, pele, dedos, todo, inteiro, aroma - e nos lábios deixa sempre reticências.
ele enfeita-me o cansaço de poemas - I'll be here when you want me like the sound inside a shell - e eu a saber que não e a fingir que sim.
ele faz do meu duche uma sinfonia dourada e envolve o meu corpo de uma espuma que eu nunca vejo, mas sinto. 

ele desaparece sem avisar e eu nem o vejo ir, assim como quando ele está e eu não o consigo ver, mas está, naquele lugar dos segredos da alma. 
outras vezes, e estas cada vez mais vezes, ele esconde-se de mim e o meu coração, que costumava ficar assim encorrilhadinho, também aprendeu finalmente a não esperar, e então, o meu músculo guardado dentro do peito, deixou de mirrar, ou então já tinha secado tudo o que tinha a secar e ficou ali assim, a bater para viver. os arrepios também desapareceram de tanto antever que ele partiria sem que eu percebesse, e as vertigens sossegaram, não mais senti que não podia regressar do mergulho que me fazia entrar em mim pela mão dele. o meu duche é agora apenas a água quente que me conforta e os recantos do meu corpo deixaram de abrigar palavras. as reticências nos meus lábios foram caindo aos poucos, e apenas resta um ponto, só, sem continuação. 

ele continua a chegar e a partir sem avisar. 
ele é menino e brinca comigo. 
eu, perdi-me no passar do tempo.